sexta-feira, 22 de março de 2024

Vasco Pedro: "Até ao fim de 2025 seria plausível" a Unbabel ser um unicórnio - SAPO - Dicionário

A Unbabel está no “caminho para a rentabilidade” e espera que nos “próximos dois, três anos” a sua dimensão seja “mais numa ordem de magnitude”. Vasco Pedro aborda os desafios da tradução automática e o impacto cada vez maior da inteligência artificial. Com a melhoria nos mercados, acredita que a empresa vai atingir em breve um dos seus objetivos.

Quais são os principais desafios no campo da tradução automática?

O principal desafio na tradução, no fundo, é a complexidade da língua e vem de algo um bocadinho vago. Nós, seres humanos, começámos a usar a linguagem desde cedo e, portanto, somos especialistas em usá-la. Como a usamos tanto, temos a sensação de que é fácil, mas tudo o que está a acontecer a partir do nosso cérebro para conseguirmos comunicar é supercomplexo. No fundo, a dificuldade da tradução vem desta perceção, desta disparidade entre a ideia de que isto devia ser fácil, de que o Google Translator resolveu isto há dez anos versus quando estamos a lidar com situações reais, em escala, com diversos conteúdos e não sei quantas línguas. Esse é o principal problema. A Unbabel surgiu em 2013, há quase 11 anos, com a ideia de que a inteligência artificial ia ter um impacto em várias áreas e a tradução ia ser uma delas. O que vimos desde essa altura até agora é uma melhoria progressiva. Atualmente, não dependendo só do tipo de conteúdo, como os pares de língua, aquilo que se consegue fazer com a inteligência artificial varia. Para o chat, no geral, já se consegue utilizar a inteligência artificial, mas para conteúdo criativo tem de se usar mais humanos, para questões legais tem de haver um humano a rever, e perceber quando é que se aplica uma versus a outra de uma maneira escalável cria muita complexidade. As empresas encontram estes problemas quando começam a entrar em mercados que muitas vezes atrasam por não terem acesso a esse mercado do ponto de vista de língua. O website não está em várias línguas. Quando começam a fazê-lo, isto é sistemático. Um website é uma coisa viva, está sempre a ser atualizado. É uma máquina que, uma vez começando, não para e vai ficando cada vez mais complexa, com cada vez mais línguas, mais conteúdos. Acho que a maior parte das empresas não se apercebem desta jornada que estão a iniciar quando começam a traduzir. Essa é a maior problemática.

Como podem ser corrigidas as falhas na tradução com o recurso, por exemplo, à inteligência artificial?

A inteligência artificial vai ter um impacto cada vez maior e cria também um fenómeno interessante. Há uma expectativa cada vez maior de hiperlocalização, ou seja, de conseguir aceder a todo o conteúdo que quero na minha língua. Essa expectativa aumenta a pressão de ter o conteúdo nessas línguas. Não há uma solução linear. Há uma dúvida essencial aqui que é o facto de, na nova iteração de inteligência artificial com Large Language Model (LLM), ainda não se ter encontrado o seu plateau. A Unbabel lançou um TowerLLM há cerca de dois meses, estamos a evoluir bastante, os resultados estão a ser superpromissores, não estamos a ver ainda um limite óbvio que vá ser alcançado nos próximos meses, mas pode ser que isso mude daqui a um ano. Essa vai ser uma questão interessante. A outra é que tudo o que não seja apenas tecnologia é exponencialmente mais complexo. Trazer humanos para virem ver coisas, trabalhar em escala – aliás, toda a expressão erro humano existe por causa dos seres humanos -, implica uma logística muito maior. Como, na tradução, isso ainda tem de acontecer numa parte relativamente significativa, é muito difícil que isso seja resolvido de uma maneira completamente escalável e garantida. Temos feito imenso progresso na medição da qualidade de tradução, que até há relativamente pouco tempo era uma caixa negra – a qualidade de uma tradução era definida pelo cliente, que lia e dizia se era boa ou não.

Disse que Portugal pode tornar-se um dos líderes mundiais a nível da inteligência artificial. O que deverá ser feito para Portugal não perder esse comboio?

Tem sido uma combinação de circunstâncias que criaram esta oportunidade, não só um crescimento nos últimos dez anos nas áreas de startups e tecnologia bastante interessante – temos várias startups que têm um núcleo de inteligência artificial, como a Feedzai, como a Unbabel, a Sword Health, que estão a fazer coisas relevantes. As nossas faculdades têm produzido talento fantástico a nível de inteligência artificial, e vê-se isso pela adoção que há em empresas de todo o mundo. Portanto, temos a massa crítica para conseguir ter um impacto. No caso da inteligência artificial, felizmente, não é uma questão de números, de se precisar de milhões de pessoas; o impacto cada vez mais consegue ser feito com grupos mais pequenos, e isso beneficia-nos. Estamos num bom momento. Temos os recursos aqui e temos alguma experiência. O que precisamos de fazer para não perder o barco? É muito fácil criar uma fragmentação e termos vários grupos diferentes com pequenas iniciativas. É preciso que haja uma iniciativa nacional para aproveitar essas iniciativas diferentes de uma maneira coerente. Tem-se falado da criação de uma Agência Nacional de Inteligência Artificial, há várias ideias a circular – nada ainda concreto, mas estou a sentir a energia nesse sentido de as pessoas estarem interessadas em falar sobre isso. Se calhar, é uma oportunidade para o novo governo de dizer “está aqui um tópico que pode ser estrategicamente importante para Portugal; como é que podemos alocar alguns recursos para acelerar este processo?”.

Leia o artigo na íntegra na edição do NOVO que está, este sábado, dia 23 de março, nas bancas

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