quinta-feira, 24 de junho de 2021

Inglês de nascimento e sem falar espanhol, Brereton vai de desconhecido a sensação do Chile na Copa América - globoesporte.com - inglês

"Hola, Chile!", diz o lateral-direito Mauricio Isla, encarando a câmera do celular, numa transmissão ao vivo no Instagram. Ele ensina o rapaz barbudo à sua direita a repetir a expressão, que ele pronuncia num castelhano com forte sotaque estrangeiro. A cena seria banal, não fosse um detalhe: assim como Isla, seu "aluno" também é jogador da seleção chilena.

Mas há algo que o diferencia dos seus companheiros de equipe. Ben Brereton Díaz nasceu em Stoke-On-City, na Inglaterra, não fala espanhol e, até o mês passado, só havia pisado uma vez naquela estreita faixa de terra na América do Sul.

O atacante deve ser titular de La Roja no jogo desta quinta-feira, às 21h, na Copa América, contra o Paraguai, no estádio Mané Garrincha.

Desconhecido no Chile

Destaque nos primeiros jogos de La Roja na competição, o atacante Ben Brereton é filho de uma chilena, mas sua convocação foi uma surpresa no país. Ele era quase um completo desconhecido do povo que hoje representa na competição disputada no Brasil.

— Quase ninguém o conhecia até bem pouco tempo. Aqui no Chile não passam jogos da Segunda Divisão da Inglaterra, onde ele joga (pelo Blackburn Rovers). Só eram transmitidas algumas partidas quando Marcelo Bielsa (argentino, ex-técnico do Chile) disputou a competição no Leeds. Mesmo quem o conhecia e pedia sua convocação, normalmente não tinha visto um jogo inteiro dele — explica o jornalista José Fernandez, dos jornais AS e Todo Es Cancha.

Brereton comemora gol em Chile x Bolívia — Foto: Divulgação/Conmebol

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Tivessem assistido à Championship (segunda divisão da Inglaterra), os chilenos teriam visto os 40 jogos e sete gols que Brereton fez na última temporada.

Rueda o "descobriu", mas não chegou a convocá-lo

Quem viu o desempenho de Brereton, de 22 anos, foi um olheiro da seleção chilena, no ano passado. O treinador da época era Reinaldo Rueda, que entrou em contato pessoalmente com a família do jogador, tentando convencê-lo a defender a Roja. Apelou até para Andrea Díaz, a mãe do atacante. Conseguiu.

Apesar de ter disputado competições de base com a Seleção da Inglaterra e até ter sido campeão europeu sub-19 como artilheiro, o jogador foi seduzido pela possibilidade de se conectar com as raízes do lado materno, já que só estivera uma vez no Chile até então.

Reinaldo Rueda, hoje na Colômbia, foi o técnico que convenceu Brereton a jogar pelo Chile — Foto: Marcos Ribolli

Mas o treinador nunca pôde convocá-lo, porque o processo de emissão do passaporte do atacante só foi concluído depois que Rueda trocou a seleção chilena pela Colômbia.

Coube ao substituto de Rueda, Martín Lasarte, chamar Brereton para os jogos das Eliminatórias sul-americanas, contra Argentina e Bolívia, em maio. O atacante não jogou nessas partidas, mas permaneceu no grupo para a Copa América - na qual o Chile enfrentaria esses mesmos adversários.

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Brereton chegou a ser campeão da Eurocopa sub-19 com a Inglaterra, em 2017, e foi um dos artilheiros da competição, com três gols — Foto: Divulgação/FA

Elogio até de Zamorano

Na competição continental, Brereton foi acionado já na primeira partida, contra a Argentina. Ficou em campo nos 15 minutos finais e não fez a diferença no empate por 1 a 1.

O melhor estava guardado para os dois próximos duelos.

Diante da Bolívia, o atacante - titular - fez o gol da vitória, seu primeiro com a camisa vermelha. Depois, contra o Uruguai, tabelou com Vargas no lance do gol chileno, determinante para outro empate (também por 1 a 1).

Em três jogos, Brereton tem um gol e uma assistência. Participou de um gol a cada 63 minutos em campo, um dos melhores indíces da Copa América. Foi alvo, por isso, de comentários positivos de praticamente toda a mídia chilena.

Recebeu elogios, por exemplo, de Iván Zamorano, lendário atacante do Chile nos anos 90.

- Ele me parece fantástico. Acredito que é um jogador diferente, que pode ser um companheiro ideal para Alexis (Sanchez), Vargas, Meneses, todos os que estão perto da área, porque ele te dá garantias que outros jogadores não dão - disse o ídolo à rádio ADN, do Chile.

Craque da seleção Chilena nos anos 90, Iván Zamorano — Foto: Divulgação / Conmebol

Após o primeiro gol pela Seleção do Chile, Brereton teve uma reação contida - mais europeia do que latino-americana.

— Foi um momento muito feliz para mim e para minha família. Minha mãe estava muito feliz por mim. Também foi importante ganhar os três pontos da vitória.

Sensação no Chile e sucesso em casa

A torcida chilena, por outro lado, ficou eufórica por ele. O gringo desconhecido virou sensação no país que ignorava sua existência há bem pouco tempo. Transformou-se no "Big Ben", apelido que faz referência ao seu primeiro nome e ao famoso cartão postal da Inglaterra.

— Acho que a torcida está amando ele. Todo mundo gostou da energia nos jogos e também o fato de que ele é um jogador bastante técnico. É rápido, mesmo sendo muito alto (tem 1,85m). Todo mundo fala do "gringo" — afirma Monica Santiago, jornalista chilena da Rádio Usach.

O sucesso de Brereton não foi ignorado na Inglaterra. O tradicional Guardian, jornal britânico, publicou a crônica do jogo entre Chile e Bolívia inteiramente baseada na atuação do jogador - "uma estreia como titular dos sonhos", de acordo com o texto.

Ele também foi destaque no Mirror e no Daily Stars, famosos tabloides da terra da Rainha.

O jornal londrino Guardian destacou primeira partida de Brereton como titular do Chile — Foto: Reprodução/Guardian

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O Blackburn Rovers, seu clube na Inglaterra, também não deixou passar batido o bom início do atacante. Além de valorizar os feitos dele nas redes sociais, começou a vender uma camisa em que o rosto de Brereton aparece misturado com a bandeira e as cores chilenas. A primeira propaganda do produto foi feita precisamente no dia seguinte ao gol que ele marcou contra a Bolívia.

— Opções de entrega internacionais estão disponíveis — avisa o Blackburn, mirando o mercado chileno.

Ativo na internet, o jogador passou a publicar fotos acompanhadas por legendas em dois idiomas: o inglês e o espanhol - o que não fazia até o dia 9 de maio, por exemplo, quando só se comunicava com a primeira língua.

Acostumar-se com o espanhol parece ser uma missão a que Brereton se impôs. Não apenas nas aulas informais com Isla ou nas redes sociais. A mãe dele garantiu à imprensa chielna que, uma vez de volta à Inglaterra, o atacante fará cursos para se tornar fluente.

Aparentemente, Brerenton precisará muito do idioma nos próximos anos.

Brereton, atacante da seleção chilena — Foto: Divulgação/Seleção Chilena

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